“O bairro do Legado Operário faz parte da história da cidade de Évora”
O Legado do Operário de Évora nasceu há 92 anos para colmatar necessidades de proteção social da classe operária, num contexto em que ainda não existia a Segurança Social. Tinha nascido tempo antes o Legado do Caixeiro Alentejano, mas estava vedada a sua adesão aos operários, que resolveram juntar forças e avançar. Nos anos 40, ergueu um bairro, que ainda hoje é uma referência na cidade e no Movimento Mutualista. Mais tarde surgiu a clínica, que vai conhecer novidades. Elsa Ferreira é a Presidente da Direção, uma das poucas mulheres a liderar uma Associação Mutualista em Portugal.
O Legado Operário de Évora tem um historial e um património muito rico. O Bairro construído nos anos 40 do século passado é, ainda hoje, uma imagem de marca?
O Bairro do Legado Operário é constituído por 86 moradias. Foi construído em duas fases, tem várias tipologias e foi, naquele tempo, pouco depois da fundação, que integrou um projeto que havia de construção de casas económicas.
Foi nesse contexto que o Legado do Operário, com todas as ajudas disponíveis ao nível do Estado, conseguiu construir aquele bairro.
É ainda hoje um elemento distintivo, mesmo no seio do Movimento mutualista?
Faz parte até da história da cidade de Évora. Fico orgulhosa, porque o projeto não sofreu qualquer alteração. O bairro continua a ser nossa propriedade, continua a ser dirigido aos Associados e, ultimamente, apresenta-se mais rejuvenescido, porque as pessoas que estavam desde o início foram falecendo e, hoje, temos muita gente jovem, que vive e gosta daquele bairro, pela sua tipologia, pela sua localização e pela sua arquitetura ainda muito atual e agradável.
Mais tarde, nasceu a clínica São João de Deus, um projeto perfeitamente consolidado na Associação?
A determinada altura, entendeu-se que a assistência médica era algo que fazia falta aos nossos associados e daí a clínica. Funciona exclusivamente nas nossas instalações e possui várias especialidades - clínica geral, de ortopedia, oftalmologia e psicologia -, mas a medicina dentária é aquela em que se sente mais a falta de respostas ao nível do Serviço Nacional de Saúde. Está prevista a inauguração de uma clínica, através da remodelação do nosso edifício que engloba a nossa área administrativa. Está situado no centro histórico de Évora, com uma certa desertificação e algo envelhecido, mas que ainda regista movimento. Pensamos conseguir ultrapassar as dificuldades arquitetónicas que esta intervenção contempla, porque é muito difícil conseguirmos as autorizações necessárias para chegar a bom termo. É um projeto que vai rejuvenescer o centro histórico da cidade de Évora e a nossa instituição.
A Associação dinamiza vários produtos mutualistas. Quais são os que registam maior procura?
São os mais recentes, mas que têm alguns anos. O mais procurado é o Plano Certo. É uma modalidade em que o associado pode ver, aos poucos, o retorno do que deposita. Depois da nova clínica, é nossa intenção rejuvenescer, também, os nossos produtos mutualistas.
Quais são os grandes desafios que a Associação tem pela frente?
Pode parecer pouco ambicioso, mas o principal desafio é conseguir manter aquilo que tem, melhorando essencialmente a qualidade dos nossos serviços. Pela nossa localização, pela população que temos em Évora, entendemos que não devemos dar passos maiores do que as pernas e pensamos que o crescimento deve ser algo bem integrado, associado mais à qualidade do que à quantidade.
No dia 8 de março, celebrou-se o Dia Internacional da Mulher. Por que razão há tão poucas mulheres à frente ou a integrar órgãos associativos nas mutualidades?
Nas mutualidades, tal como noutras áreas. Não é por uma razão especial é uma consequência da formação, da disponibilidade e da vontade de cada um tem de se envolver.
As mulheres podem trazer algo de novo ao movimento?
Tal como nas outras atividades.
Como é que O Legado Operário tem trabalhado esta questão dos jovens?
O arrendamento de casas no bairro tem sido uma forma de atrair casais mais jovens. A proximidade da universidade também ajuda. A Associação tem tido alguma preocupação em dizer aos mais velhos para trazerem os mais novos.
“Associações Mutualistas não são empresas”
Elsa Ferreira tem uma visão muito própria sobre o futuro do Mutualismo. Considera que há certos caminhos que descaracterizam o Movimento. Admite que o empreendedorismo social, o voluntariado e a inovação são importantes para a evolução do Movimento, mas não aprecia a tendência de alargar demasiado a ação a várias áreas e espaços. “A proximidade das pessoas e o local onde estão inseridas é essencial e acho que deve haver uma grande rede de associações mutualistas, mas em que, cada uma está no seu sítio. A nossa diversidade de atividade já permite que sejamos tão ricos, não vamos todos querer fazer o mesmo”, diz, acrescentando que a competição entre elas acarreta “limitações” e “pode ser um risco” de descaracterizar. Modernizar sim, mas sem perder identidade, “sem desvirtuar a essência”, porque, na sua perspetiva, associações mutualistas não são empresas. “Dentro das áreas de ação das IPSS, cada uma terá o seu papel e não vale a pena concorrermos umas com as outras. Cada uma deve desenvolver aquilo que lhe é mais exclusivo”, sustenta.
publicado em 03-03-2020 | 10:07